O comparsa do Saca-a-rolha deu o mote: prós e contras nos vinhos brancos nacionais, e foi buscar como exemplo dois posts publicados recentemente aqui nas KV e no Pingas no Copo, deixando no ar a hipótese de termos, eu e o Pingus, opiniões contrárias acerca dos brancos portugueses.
Bom, meus caros, eu mantenho aquilo que disse em relação às castas estrangeiras usadas nos brancos portugueses, e também em relação a não sermos um país de grandes brancos. De facto, as provas que tenho feito é que me conduziram a essa opinião, porque não tenho nenhum “parti-pris” em relação aos vinhos brancos, como não tenho em relação a nenhum tipo de vinho, seja ele verde, rosé, espumante ou generoso. Nos primeiros tempos das Krónikas Vinícolas tive oportunidade de reproduzir alguns textos que já tinha escrito anteriormente nas Krónikas Tugas a esse respeito, intitulados “Reflexões à volta da garrafa”. Podem lê-los aqui:
Reflexões à volta da garrafa (1) - O preço é só um começo
Reflexões à volta da garrafa (2) - Os fundamentalistas
Reflexões à volta da garrafa (3) - Fácil de beber é mau?
Reflexões à volta da garrafa (4) - Vinho é tinto, branco é refresco e verde é a cor da garrafa?
Reflexões à volta da garrafa (5) - Beber tinto à temperatura ambiente?
Embora o tinto seja o meu tipo de vinho preferido, não rejeito qualquer outro. Aliás, um dos artigos que escrevi começava precisamente com aquela frase onde às vezes se diz, meio a sério meio a brincar, que vinho é tinto, branco é refresco e verde é a cor da garrafa.
Repescando algumas opiniões então expressas, referi até que acho mais fácil (e mais “aceitável”, digamos) acompanhar carne com vinho branco do que peixe com vinho tinto. No Verão, principalmente, e com algumas carnes brancas, já tenho optado por vinho branco com bons resultados. Foi o que fiz na minha última visita ao Chafariz do Vinho. Com as entradas, se o repasto for em casa, também prefiro servir um branco. Aliás, sendo o branco normalmente mais leve, também se pode tornar mais versátil que o tinto. Por exemplo, Frei João branco com bife na pedra. Só a ideia choca, não choca? Mas só experimentando é que se sabe, e olhem que não fica nada mal.
A questão está em saber “que” brancos é que temos, e continuo a achar que a qualidade média é claramente inferior à dos tintos. Se calhar também não é tão fácil fazer um bom branco como um bom tinto, devido à diferente matéria-prima (ausência das películas das uvas no processo de fermentação dos brancos, sabendo-se que é à película que os tintos vão buscar boa parte das suas características mais importantes). Mas por isto ou por aquilo, tenho provado muitos brancos que têm ficado longe de me agradar. Em relação aos alentejanos, por exemplo (eu que sou fã dos tintos do Alentejo) não há nenhum que me tenha agradado até agora, nem o Esporão que é sempre considerado um dos melhores (ainda não provei o Pêra-Manca, mas tenho uma garrafa à espera). Acho-os sempre rústicos, agrestes, amargos. Nesse aspecto vou até pela opinião mais radical do João Paulo Martins que acha que o Alentejo só devia produzir tintos.
O problema que encontro nos nossos brancos é precisamente a tal falta de “finesse” que encontrei no Saga, dos Rothschild, que raramente se encontra nos portugueses, e que é mais evidente quando comparamos vinhos feitos com castas como a Chardonnay ou Sauvignon Blanc. A explicação mais lógica é precisamente a de que o nosso clima não propicia vinhos brancos elegantes e frescos, tornando-os pesados e ásperos, além de que se continua inexplicavelmente a exagerar no grau alcoólico. No entanto, se procurarem mais para trás nos posts que escrevemos sobre brancos, verão que tenho alguns brancos de eleição em Portugal, concretamente em duas regiões: Terras do Sado e, principalmente, Bucelas, que para mim tem os melhores brancos nacionais (isto em termos genéricos, naturalmente). Se calhar porque têm o perfil que mais me agrada, a tal “finesse”. Também tenho encontrado alguns bons no Dão, na Bairrada e no Douro (ainda não provei o Redoma, por exemplo, que tem sido muito elogiado, mas hei-de lá ir qualquer dia).
Conclusões? Podem vocês tirá-las, se quiserem, mas a minha é que não sou propriamente contra, corroboro até a opinião do Pingus de que os nossos brancos estão a ganhar o seu espaço, mas também acho que lhes falta percorrer um grande caminho até atingirem a excelência. Talvez as regiões mais altas sejam a melhor aposta para se chegar lá.
Kroniketas, enófilo esclarecido
Veja aqui as nossas apreciações a vinhos brancos, nacionais e estrangeiros:
Portugueses
Adega de Pegões, Colheita Seleccionada 2005 - 6,5
Bucellas, Arinto 2004 - 6,5
Bucellas Caves Velhas 2003 - 7,5
Casa de Santar 2004 - 6,5
Dão Caves Velhas 2003 - 5,5
João Pires 2004 - 8
Planalto - 7
Prova Régia, Arinto 2004 - 8
Quinta da Alorna, Colheita Tardia 2003 - 6,5
Quinta de Cabriz, Experiência VL-1 99 - 7
Quinta de Cidrô Reserva, Chardonnay 2004 - 6
Três Bagos, Sauvignon Blanc 2003 - 4
Vinha Grande 2005 - 6
Estrangeiros
Barons de Rothschild, Saga R 2005 (França) - 8
Cimarosa, Chardonnay (Chile) - 6
Trebbiano 2005 (Itália) - 5,5
William Fevre 2004 (França) - 7,5
William Fevre, Sauvignon Blanc 2004 (França) - 8,5
sábado, 24 de março de 2007
Vinhos brancos nacionais - prós e contras
quarta-feira, 15 de março de 2006
Reflexões à volta da garrafa (5) - Beber tinto à temperatura ambiente?
(republicação adaptada; post original de 31 de Julho de 2004, nas Krónikas Tugas)
Para concluir este conjunto de reflexões vou-me debruçar (sem entornar) sobre o último dogma: branco e verde bebem-se frescos e tinto bebe-se à temperatura ambiente.
Se a primeira premissa está certa, nada de mais errado para a segunda. “Temperatura ambiente” no Verão significa beber o vinho a 30 graus. Isso seria se o vinho tivesse acabado de sair duma cave fresca. Qualquer livro ou revista refere as temperaturas a que os vinhos devem ser bebidos e nunca vi nenhum que recomendasse beber o vinho tinto a mais de 18º C. O que é grave é a falta de noção que existe nos nossos restaurantes a este respeito. Já tivemos algumas situações hilariantes com empregados de mesa ignorantes na matéria, havendo um que teimava que um vinho que trouxe morno para a mesa estava a 17º!!! Também tenho surpreendido alguns comparsas à mesa ao pedir um frappé, o que motiva este invariável comentário: “não sabia que se refrescava o vinho tinto”. A minha resposta também é invariável: “não se refresca, não se pode é beber morno”. Nada que uma hora no frigorífico ou um balde com gelo e água ou mesmo uma manga de refrigeração não resolvam (esta última, aliás, até refresca mais depressa que qualquer uma das outras opções). Se for no restaurante, não hesitem em pedir para arrefecer o vinho se este vier morno, porque fica imbebível e só se sente cortiça na boca, perdendo completamente os aromas.
Quanto aos brancos, verdes, rosés e espumantes, não há problema: se ficarem frios demais (o que também os faz perder os aromas, e não se deve cair no exagero oposto), ao irem para a mesa e serem servidos nos copos a temperatura começa rapidamente a subir, por isso depressa atingirão uma temperatura ideal. Mesmo os tintos, depois de arrefecidos, começam a aquecer depois de servidos. E no Verão a questão da temperatura é fundamental para não se andar a beber vinho “quente”. Porque não comprar um termómetro de vinho para tirar as dúvidas? Pode-se colocar o termómetro no copo ou na garrafa, quando esta ainda está cheia, e certamente haverá muitas surpresas em relação à temperatura a que se está a beber o vinho.
Em resumo, e seguindo algumas indicações que se podem obter por aí, dum modo geral as temperaturas do vinho deverão andar à volta destas:
- Espumantes e champanhes - 6 a 8 ºC
- Brancos jovens e secos; rosés - 8 a 10 ºC
- Brancos encorpados ou fermentados em madeira - 10 a 12 ºC
- Tintos jovens e ligeiros - 12 a 14 ºC
- Tintos jovens encorpados - 14 a 16 ºC
- Tintos velhos ou de reserva - 16 a 18 ºC
Para os vinhos generosos, a regra é mais ou menos a mesma. Os Portos tintos andarão entre os 14 e os 18º C, conforme a idade, e os brancos, assim como os moscatéis e madeiras, entre os 10 e os 14 ºC.
Isto são tendências gerais, servem apenas como indicadores, mas o gosto pessoal pode variar, pelo que cada um depois adapta a temperatura às suas preferências, mas o que é importante é termos a noção de que o vinho, sendo tinto, não se bebe morno, porque não é sopa, mas também não se bebe fresco - apenas nos muito jovens, como o Alandra, ou nos claretes se bebe ligeiramente refrescado - e o branco tem que ser obrigatoriamente refrescado para não saber a xarope. E ter em atenção que quanto mais doce o vinho mais fresco deve ser bebido.
À vossa!
Kroniketas, enófilo esclarecido e de termómetro no copo
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quinta-feira, 9 de março de 2006
Reflexões à volta da garrafa (4) - Vinho é tinto, branco é refresco e verde é a cor da garrafa?
(republicação adaptada; post original de 28 de Julho de 2004, nas Krónikas Tugas)
E agora a questão que, aparentemente, seria a mais fácil, mas pode ser a mais difícil: que vinho é que se bebe em cada circunstância? Mais uma vez, devemos deixar de lado os fundamentalismos. O que é curioso aqui é que os dogmas são muitos e quase sempre estão completamente errados.
1º - Vinho é tinto, branco é refresco e verde é a cor da garrafa. Por acaso é uma questão que me deixa algures a meio caminho entre o sim e o não. Quando falo de vinho, normalmente falo de tinto. Quase todas as referências que fiz até agora a marcas de vinhos eram acerca de tintos. Quando falo de branco ou verde refiro-o expressamente.
Também é verdade que nas compras que faço, compro uma garrafa de vinho branco ou verde por cada 8 ou 9 de tinto. As cartas de vinhos nos restaurantes são esmagadoramente maioritárias em tintos, as feiras de vinhos também. É um facto que em Portugal a produção de vinho tinto é muitíssimo superior à de branco (excepção feita à região de Bucelas que só tem denominação de origem para brancos, mas onde se produzem tintos como Vinho Regional Estremadura). No caso do Alentejo, sou até da opinião de um dos mais conhecidos autores de guias de vinhos, João Paulo Martins, que acha que, pura e simplesmente, não se devia produzir ali vinho branco. Pode parecer estranho mas a verdade é que, contrariamente ao que penso dos tintos, aos brancos alentejanos falta elegância, suavidade, e por muito que tente não consigo encontrar um de que goste realmente. Também acho que o tinto é, por natureza, “mais vinho” que o branco. Há outra estrutura, outros aromas para descobrir que faltam nos brancos. É preciso não esquecer que os tintos são fermentados em contacto com a pele da uva e é daí que extraem a cor e os taninos (que dão ao vinho adstringência e capacidade de envelhecer), o que nos brancos não acontece. À partida, a matéria-prima é mais favorável para a produção de bom vinho tinto do que branco, sendo mais fácil obter um bom produto a partir de uvas tintas do que de uvas brancas - isto é dito por um produtor que também é especialista em análise sensorial, o Prof. Virgílio Loureiro. Mas...
Estaria a ser fundamentalista se dissesse que o vinho branco é apenas refresco. Apesar de ser um confesso fã dos tintos (ou se calhar até por isso mesmo), nos últimos anos tenho tentado alargar o meu leque de conhecimentos nos brancos. É certo que me é mais difícil gostar dum branco que dum tinto, mas há vinhos brancos francamente bons, e para cada um a sua função. Pessoalmente gosto dos brancos leves, suaves e secos. Neste aspecto, acho que os de Bucelas são os melhores, muito equilibrados em todas as suas características. Na região de Setúbal também há bons brancos, como o BSE, o João Pires, o Quinta de Camarate e o Catarina. No Douro também há brancos com alguma leveza, como o Planalto.
Quanto aos verdes, têm características muito próprias e, devo confessar, são aqueles em que sou menos exigente. Se é verdade que os da casta Alvarinho têm normalmente uma estrutura e uma elegância que os distingue dos outros, a facilidade com que se bebem (até como aperitivo) permite-me gostar de quase todos, com destaque para os das casta Loureiro, que permite obter vinhos excelentes. Mas o facto de tanto os brancos como os verdes poderem servir de aperitivo não nos deve deixar com essa visão redutora de que são apenas refrescos. A prova final faz-se sempre com a comida, o que nos leva ao segundo dogma.
2º - Tinto bebe-se com carne, branco com peixe, verde com marisco. Já houve tempo em que este pensamento fazia lei, mas na realidade não é tanto assim. Como regra geral funciona e nada impede que se siga esse princípio, mas devemos ter alguma abertura para as excepções, que não são assim tão poucas. Há pratos de carne que não ficam nada mal com vinho branco e, curiosamente, algumas carnes até são difíceis de ligar com vinho tinto. Frango é uma delas. Muitas vezes um vinho tinto pode ser demasiado pesado para a carne de frango. Do mesmo modo, certos pratos de peixe casam perfeitamente com vinho tinto, como as sardinhas assadas (aqui até se pode misturar Seven-up ou optar pela sangria, mas nesse caso não vale a pena escolher um bom vinho...), alguns peixes assados no forno ou certos pratos mais pesados de bacalhau (embora eu prefira um branco mais leve ou um verde, tal como já tive ocasião de referir).
De qualquer modo, o que é importante é não chocar os sabores e equilibrar o “peso” do vinho e do prato: nem o vinho deve abafar o sabor da comida, nem a comida deve anular o sabor e o aroma do vinho. Por isso, vinhos mais leves para entradas e comidas delicadas e vinhos mais cheios e pesados para pratos substanciais. É impensável servir um vinho branco com feijoada ou um tinto com peixe grelhado e menos ainda com marisco. É que há sabores que não ligam mesmo. Mas com muitas carnes um vinho branco encorpado não vai nada mal, ao contrário do que se pensa, e no verão até se torna agradável. Em todo o caso, choca-me menos, dum modo geral, acompanhar carne com brancos do que peixe com tintos.
Quanto aos verdes, já disse que gosto deles com bacalhau mas o consumo mais habitual é com mariscos. São vinhos geralmente leves, aromáticos e frescos na boca por causa da sua acidez. Um branco leve, como os de Bucelas, muitas vezes também servirá para o mesmo efeito.
Quando falamos de verdes costumamos esquecer o verde tinto, que é praticamente desconhecido fora da região onde se produz. Bebe-se fresco, mas é agressivo e por isso difícil de gostar por quem não está habituado a bebê-lo. No entanto adequa-se bem a pratos pesados como rojões, sarrabulho ou cabidela (para quem gosta deles).
Ainda há os rosés, que são feitos com uvas tintas mas estão menos tempo a fermentar em contacto com a pele das uvas. Devido à sua leveza e frescura também se aplicam em muitas ocasiões em alternativa aos brancos, mas eu gosto deles é com comida chinesa ou italiana (e ainda está por esclarecer a questão do rosé versus clarete).
Para finalizar temos os espumantes, que pretendem imitar o Champanhe e que não servem só para festas. São muito recomendados, por exemplo, para acompanhar leitão à Bairrada, aconselhando-se aqui que seja espumante bruto. Os mais doces, por serem doces só ficam bem com... doces. E esqueçam os Asti’s italianos: esses parecem mais Seven-up com álcool do que propriamente vinho.
Quando se fala de entradas, queijos ou enchidos as hipóteses são várias, porque dependendo das características de cada comida pode-se beber branco, tinto, rosé ou espumante. Num curso de prova que frequentei com o Prof. Virgílio Loureiro fiz uma prova cega em que nos deram rosé para acompanhar tâmaras enroladas em bacon. Toda a gente achou que ligava na perfeição. Por isso, não há nada como ir experimentando para tirar conclusões.
3º - Branco e verde bebem-se frescos e tinto bebe-se à temperatura ambiente. Esta fica para a próxima, para concluir.
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segunda-feira, 6 de março de 2006
Reflexões à volta da garrafa (3) - Fácil de beber é mau?
(republicação adaptada; post original de 25 de Julho de 2004, nas Krónikas Tugas)
Tínhamos ficado a dissertar sobre os fundamentalismos acerca da qualidade dos vinhos de cada região. Afirmei no post anterior que é errado colocar uma região acima das outras só por uma questão de princípio. Existe uma certa corrente que faz crer que os vinhos do Douro são melhores que todos os outros. Sempre ressalvando que é tudo uma questão de gosto, devo dizer que não concordo, porque mesmo nalguns parâmetros objectivos em que o vinho deve ser apreciado, a região do Douro tem sido aquela em que tenho apanhado mais e maiores decepções, por razões diversas.
Não é que eu não me esforce por tentar descobrir em todos os vinhos que bebo alguma qualidade, mas já tive uma sucessão de experiências com vinhos de produtores de nome conceituado que não me deixaram saudades. Não sei o que dizer de abonatório quando um vinho não tem corpo, não tem aroma, não tem acidez e quase não tem sabor, mas é o que me tem acontecido vezes demais com os vinhos do Douro. Não quero com isto dizer que não há vinhos excelentes, mas quanto mais alargo o leque de provas nesta região mais concluo que devo ficar pelos mesmos. Dentro daquilo que considero preços decentes (fixei um patamar nos 15 €, que excepcionalmente pode ser um bocadinho alargado, e já não é pouco), alguns exemplos de vinhos que nunca me deixaram ficar mal: Messias Reserva, Scarpa (não sei se ainda existe porque não o tenho visto à venda), Quinta do Côtto, Evel ou Vila Régia. Destaco o Duas Quintas e o Sogrape Reserva (branco e tinto), sem dúvida os meus preferidos nesta região. E naturalmente há o Quinta da Leda e o Callabriga, da Casa Ferreirinha (propriedade da Sogrape) no topo dos topos. Claro que não estou a pensar em vinhos de 30 ou mais euros, porque com um preço desses qualquer vinho tem de ser excepcional, mas não são esses que fazem o padrão médio duma região. Não se pode tomar como bitola o Barca Velha ou o Reserva Ferreirinha, mas o que está ao alcance da generalidade do comprador que procura um vinho de qualidade mas não quer pagar uma fortuna por 7,5 dl de líquido. Eu, pelo menos, é assim que faço as minhas apreciações, embora alguns supostos entendidos na matéria pareçam esquecer-se deste “pormenor” do preço, como se as pessoas que lêem os guias que eles escrevem fossem comprar ao desbarato! Quem faz guias de vinhos não pode ter em conta apenas o seu próprio gosto, mas considerar que se está a dirigir a pessoas que não têm os mesmos parâmetros de avaliação nem sequer as mesmas possibilidades de provar centenas de vinhos de borla!
Neste sentido, volto ao Alentejo para dizer que, não sendo melhor que as outras regiões, tem maior quantidade de vinhos que, pelo conjunto das suas características, são fáceis de beber e de gostar pela maioria das pessoas. São bem encorpados (enchem a boca), são aromáticos quanto baste, geralmente macios porque têm pouca adstringência e estão prontos para beber pouco tempo depois da colheita. O que é que existe de errado aqui? Na minha opinião, nada. São características que resultam em grande parte do clima, onde as uvas atingem um estado de maturação elevado mais facilmente do que noutras regiões do país e até do estrangeiro. Um exemplo de sucesso no Alentejo são os vinhos da casta francesa Cabernet Sauvignon, que já referi como sendo uma das minhas paixões. Por causa do seu maior amadurecimento devido ao clima, mesmo isolada permite obter vinhos muito mais macios do que em Bordéus, donde é originária e onde tem que ser misturada com a Merlot para amaciar o vinho.
Há contudo quem escreva nos guias e tenha a opinião de que “os vinhos do Alentejo são muito fáceis”, dando a esta opinião uma carga pejorativa. Mas eu digo-vos: se querem um vinho tinto que fique bem com quase todos os tipos de comida e agrade ao mais leigo dos consumidores, o Alentejo quase sempre satisfaz. Por isso também há quem diga que é a região da moda. Sem prejuízo das marcas mais caras que citei no post anterior, que são de qualidade muito acima da média, há muito mais por onde escolher com resultados satisfatórios a preços razoáveis (ver As nossas escolhas). Daí a razão de cerca de 1/3 da minha garrafeira ser constituída por vinhos desta região.
Não caiamos, no entanto, no exagero oposto de achar que, por este motivo, só se deve beber vinho alentejano, porque é o único que não arranha ou arranha menos que os outros. Vinho não é groselha, é uma bebida alcoólica e tem que ser apreciada como tal. Por isso há que procurar outras características noutras regiões. Os vinhos do Dão, quanto a mim, são até aqueles que, quando atingem o ponto ideal de envelhecimento, se tornam mais macios sem perderem a acidez. Já partilhei com os comparsas habituais algumas garrafas dos anos 70 e 80 que foram experiências fantásticas de vinhos velhos que mantêm uma elegância incomparável, como não encontrei em mais nenhuma região do país. Ainda não há muito tempo comprovei isso com uma garrafeira de 85 de Dão Messias.
Do outro lado está a Bairrada. São os vinhos mais difíceis porque enquanto novos são muito adstringentes, por isso arranham muito na boca. Mas a partir dos 10 anos desenvolvem um conjunto de aromas com uma profundidade e complexidade que não se encontra nos outros. Por vezes quase vale a pena só aspirar o aroma do vinho e deixá-lo ficar no copo. É preciso algum tempo e paciência para aprender a apreciá-los, mas com pratos bem temperados conseguem-se algumas refeições memoráveis. Experimentem o Frei João, que até é barato, com fondue de carne ou bife na pedra e verão se não calha a matar.
Acresce que alguns produtores, como Luís Pato, começaram a fazer os seus vinhos de modo a torná-los mais bebíveis enquanto novos, o que facilita a compra sem nos obrigar a guardar a garrafa 5 ou 10 anos. E convém não esquecer que algumas empresas bairradinas são das mais famosas e antigas no ramo, como as Caves Aliança e as Caves Messias.
Existem agora outros vinhos em clara ascensão e que começam a impor-se, como os da Estremadura e do Ribatejo, que vale a pena descobrir. Durante muito tempo associava-se ao Ribatejo a imagem do vinho carrascão, de garrafão e taberna. Nos últimos anos tudo mudou e ganharam uma elegância que os coloca a par dos melhores. Basta ver a quantidade de marcas que vão aparecendo e que são garantia de qualidade, como a Casa Cadaval, Fiúza ou Quinta do Falcão. Na Estremadura também há um nome que para nós é incontornável: Quinta de Pancas, que tem vindo a alargar o seu leque de opções no mercado.
Não esquecer a região de Setúbal, onde se produz a marca de vinho mais antiga de Portugal, o Periquita. Aliás, nesta região - em Azeitão, mais concretamente - estão sedeadas duas das maiores empresas portuguesas de vinhos, a José Maria da Fonseca e a Bacalhôa Vinhos (antiga J. P.). Daqui saem alguns dos vinhos mais conhecidos, como o Quinta de Camarate (branco e tinto), o BSE, o João Pires e o Quinta da Bacalhôa (de que aliás não sou grande apreciador porque considero que tem excesso de aroma a madeira).
Em resumo, o que vale a pena é ir à procura do que existe. Não excluir, à partida, nenhuma região, provar vinhos de todas. Quanto melhor as conhecermos mais hipóteses temos de refinar as nossas escolhas e, até, saber que preço é que vale a pena pagar por cada garrafa.
E agora, a eterna questão que fica em suspenso: branco, tinto ou verde?
Kronilketas, enófilo esclarecido e a escrever ainda sóbrio
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quinta-feira, 2 de março de 2006
Reflexões à volta da garrafa (2) - Os fundamentalistas
(republicação adaptada; post original de 20 de Julho de 2004, nas Krónikas Tugas)
Vamos falar agora de alguns chavões que por vezes se vão ouvindo por aí. Ponto assente: eu costumo dizer que as minhas opiniões só me vinculam a mim próprio. Não as tomo como verdades absolutas (não me levo tão a sério a esse ponto), reflectem apenas a minha verdade, os meus gostos, o meu modo de ver o que me rodeia. No caso concreto deste assunto, no entanto, o que aqui fica escrito reflecte a linha de pensamento dos autores deste blog.
Outro ponto assente: gostos não se discutem, e cada um faz as suas escolhas segundo os seus próprios parâmetros de avaliação e o seu grau de exigência.
Na compra de um bem, artigo ou serviço, o que é mais importante para mim, ou o factor que eu mais valorizo, será aquilo que vai determinar a minha decisão, e pode ser completamente diferente da pessoa que chega imediatamente antes ou depois de mim. Daí também vai depender o montante que cada um está disposto a gastar na aquisição do bem em causa. Se eu vou jantar a um restaurante com um serviço esmerado, uma ementa variada, uma carta de vinhos extensíssima e empregados de mesa de fato e lacinho, tenho um grau de exigência elevado e estou disposto a pagar por isso. Mas se entrar no McDonald’s ou na Pizza Hut não espero pagar muito.
Vem isto a propósito de uma conversa sobre vinhos que uma vez tive num jantar com uns amigos. Nisto dos vinhos os critérios são ainda mais subjectivos, porque os parâmetros de avaliação têm sobretudo a ver com uma questão de gosto pessoal. Não é como nos computadores, em que tudo é mensurável em números e nós sabemos o que implica determinada velocidade do processador, capacidade de memória, espaço em disco ou memória da placa gráfica. Mas quando se abre uma garrafa de vinho, para além de não se saber exactamente o que vai sair de lá, a apreciação é individual e ainda por cima condicionada por inúmeros factores externos ao próprio vinho (temperatura do local e do vinho, comida, copos, até a companhia).
Na conversa em causa, um dos convivas citava uma opinião que tinha ouvido (ele já não se lembrava bem de quem, mas era de alguém supostamente bem informado dentro do ramo) acerca dos vinhos alentejanos. A citada opinião referia que “dificilmente o Alentejo poderá ter vinhos verdadeiramente bons, porque lhe falta uma coisa essencial: o solo de xisto”.
Logo à partida esta opinião parte duma premissa falsa. Não há nada escrito em lugar nenhum que diga que os solos onde se cultiva a vinha têm que ser de xisto. Mas o que é curioso é que a afirmação contém em si mesma várias falsidades. Ora vejamos:
1º - O tipo de solo é um dos factores mais variáveis. Existem solos de xisto, basalto, granito, argila (caso da Bairrada), areia (caso de Colares), e todos podem produzir bons vinhos.
2º - O solo não é o único factor (e não é necessariamente o mais determinante) na qualidade do vinho. Pode moldar as suas características mas há outros igualmente importantes: o clima e, acima de todos, obviamente, a uva. Portanto, antes de mais nada, a natureza é que manda e qualquer um destes factores da natureza tem o seu peso no resultado final, pelo que é redutor fazer depender a qualidade do vinho das características do solo.
3º - Também não é verdade que não haja xisto no Alentejo e isso demonstra-se da forma mais simples possível: com o nome dum vinho do Redondo, produzido pela Roquevale, chamado precisamente “Terras de xisto”. Curiosamente, não me lembro de mais nenhum vinho em que a própria marca faça referência ao xisto.
4º - Depois não basta cultivar as uvas. É preciso fazer o vinho e aqui entra o enólogo, para além da tecnologia de que a empresa produtora dispõe. E o papel do enólogo tem cada vez mais importância na definição do estilo de vinho que se quer colocar no mercado.
Mas aquela afirmação ainda poderia ser comentada de outro modo. Na mesma altura almocei também com um amigo e abrimos uma garrafa de ½ litro de Touriga Nacional da Herdade do Esporão, de 2000. Contei-lhe a conversa anterior e comentei assim: “quem diz aquilo de certeza que nunca bebeu este vinho”.
De facto, só quem nunca provou algumas preciosidades alentejanas que há por aí é que pode fazer uma afirmação gratuita como aquela. Experimentem comprar o Garrafeira dos Sócios, da Cooperativa de Reguengos de Monsaraz (Carmim), o Reserva Sogrape (ou mais recentemente os Herdade do Peso), um dos vinhos monocasta da Herdade do Esporão (Aragonês, Trincadeira, Bastardo, Touriga Nacional, Syrah) ou o Quatro castas (preços entre os 10 e 15 €); ou, se não quiserem gastar tanto, experimentem o Reguengos Reserva, o Roquevale de rótulo preto, os monocasta da Carmim ou do João Portugal Ramos ou o Borba Reserva (entre os 5 e os 10 €). A seguir venham-me dizer que não prestam, ou que há por aí muito melhor!
Claro que há gostos e gostos. Não vou afirmar que os vinhos do Alentejo são os melhores do mundo ou do país, apesar de serem os que tenho em maior quantidade na minha garrafeira (isso é questão para mais tarde). Mas há bons vinhos em todas as regiões do país, e apreciá-los é não só uma questão de gosto, mas também de cultura e de educar o paladar e o olfacto para se conseguir captar toda a gama de aromas e sabores tão diferenciados que os nossos vinhos apresentam. E olhem que vale a pena.
O que é preciso é não sermos fundamentalistas, porque neste como em muitos outros aspectos o fundamentalismo limita-nos o raciocínio e estreita-nos a vista (e neste caso mais o olfacto e o paladar). No caso dos vinhos, é demasiadamente redutor dizer-se que “os desta região é que são bons”, “os daquela região não prestam” ou “estes são os melhores”. Assim como aquela frase que diz “vinho é tinto, branco é refresco e verde é a cor da garrafa”. Será?
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quarta-feira, 1 de março de 2006
Reflexões à volta da garrafa (1) - O preço é só um começo
(republicação adaptada; post original de 17 de Dezembro de 2003, nas Krónikas Tugas)
Lá dizia a propaganda do beato de Santa Comba Dão, que beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses. Nos tempos que correm não serão tantos a comer, com certeza, mas os que produzem fazem-no bem melhor. Findo que está o reinado do vinho a granel, que corria baixo das tabernas esconsas de bairro, nas últimas duas décadas tem sido percorrido um longo caminho em direcção à qualidade.
Não só os produtores, na sua maioria, apostaram definitivamente nessa qualidade, como também os consumidores, inundados de informação vinícola, com guias, roteiros e feiras de vinhos anuais, estão mais exigentes e por isso a selecção dos produtos vendidos tem de ser ainda mais rigorosa. Só há uma coisa que espanta: como é que podem aparecer todos os anos mais não sei quantas marcas de vinho, em particular do Alentejo? Haverá vinha para tanto vinho?
De qualquer modo, há por aí umas preciosidades que vale a pena descobrir sem entrar na loucura de alguns preços verdadeiramente obscenos (cá para mim, 35, 40, 50, 75 euros ou mais por uma garrafa é escandaloso, principalmente para o país que somos).
Há pouco mais de dois anos, ainda as Krónikas Tugas não estavam sequer em embrião, deparei, quase por acaso, com umas garrafas da Sogrape, sem grande aspecto, com rótulo modesto, preto com letras vermelhas. Dizia apenas isto: Quatro regiões, 1997. Feito com uvas provenientes de quatro das mais famosas regiões do país, Douro (Tinta Roriz), Dão (Touriga Nacional), Bairrada (Baga) e Alentejo (Trincadeira), vinificadas separadamente e depois loteadas para produzir o vinho de que aqui se fala. Classificado como vinho de mesa. Preço: 12,77 €, carote.
Contactados os potenciais compinchas do costume, ficou decidido comprar duas que seriam deglutidas por três (sim, porque os amigos não são só para partilhar o néctar, mas também o seu custo). E assim, na primeira ocasião lá se despejaram (para dentro) as garrafas, com a promessa de voltar à carga. Resultado: um espectáculo! Mas vindo da Sogrape outra coisa não seria de esperar. Claro que, agora, o vinho já não está no seu máximo, como já aqui demos conta, mas a impressão então recolhida permanece. Afinal, de que serve uma classificação do IVV, quando o que está dentro da garrafa é que conta?
Nos últimos anos exagerou-se no preço dos vinhos, mas a moda parece ter passado e já se ter voltado a patamares mais razoáveis. Errado é comprar pelo rótulo, ou comprar só o caro porque o caro deve ser bom (se puderem fazê-lo). Se não sabe, procure o conselho de quem conhece, ou um dos inúmeros guias que por aí andam (ou, em última análise, se estiver mesmo desesperado, leia as Krónikas Vinícolas!). Mas deixem-me dizer que muitas vezes temos confirmado que diferenças grandes de preços - por exemplo entre um vinho “normal” de uma marca e a respectiva Reserva - não se justificam minimamente. Gastando muito menos podem comprar-se vinhos quase tão bons. Só um exemplo: o Duas Quintas, de que já falámos oportunamente e de que já se consegue comprar uma garrafa por menos de 7 €. O preço do Reserva vai para os 35 - 40 €. Será que este é 5 vezes melhor que aquele? Dificilmente o será. Não que não seja melhor, mas nesta como noutras coisas, há que conhecer a relação qualidade-preço e escolher ponderadamente. Não limite o seu prazer, mas não o faça depender demasiado do recheio da sua carteira.
Kroniketas, enófilo esclarecido
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quarta-feira, 28 de dezembro de 2005
Bacalhau: branco ou tinto? A polémica (3)
1 - Mariconço é a avozinha!
2 - Havendo 1001 maneiras de cozinhar bacalhau, é demasiado redutor pensar em pratos "normais" como sendo bacalhau com grão, com couve ou com todos, que na minha modesta opinião são a PIOR maneira de confeccioná-lo. Aliás, ainda na minha modesta opinião, são a PIOR maneira de confeccionar seja o que for.
3 - Assim sendo, esses dois ou três pratos não podem servir como bitola para uma apreciação mais genérica. Bacalhau à Brás ou à Gomes de Sá não são pratos mariconços, um é lisboeta e o outro é portuense. Não falando no bacalhau à Lagareiro ou à Zé do Pipo, que não sei donde são originários.
4 - Agora experimentem um desses pratos decentes (que são tradicionais e não mariconços) com vinho tinto (leve ou pesado) e com branco ou verde. Depois não vão falar com o Tuguinho: venham falar comigo, porque eu GOSTO mesmo de bacalhau de quase todas as maneiras... menos aquelas. E digam-me se o tinto lhes sabe bem.
Kroniketas, enófilo esclarecido
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Bacalhau: branco ou tinto? A polémica (2)
Já que estamos em época de campanha eleitoral, e como não fazia sentido estar aqui a comer bolo-rei de boca aberta, decidi prantar a minha resposta ao Kroniketas em jeito de comunicado.
Vamos então esclarecer umas coisitas:
1. Beber vinho tinto com bacalhau não é dogma nenhum e que vinho beber depende de forma crítica do tipo de prato confeccionado com o referido gadídeo.
2. Quando penso em bacalhau, penso essencialmente nas formas mais tradicionais de o confeccionar: com todos, com grão ou naquela variedade de receitas no forno que vão dar mais ou menos ao mesmo (cebola por cima e etc.). Não me vêm à ideia aquelas formas mais mariconças de cozinhar o espalmado como o bacalhau com natas, o espiritual ou outras afins.
3. Concordo em absoluto que em relação a estas últimas um branco ligeiro é a melhor opção, se bem que um tinto novo, leve e frutado, também não caia mal.
4. O Kroniketas confessou-me que não come bacalhau com grão (nem a sua variante meia-desfeita) e não gosta de bacalhau com todos. Assim sendo, se bebeu tinto com os tais pratos mais delicados, é natural que não tenha ligado bem.
5. Eu acho que com os pratos mais tradicionais o tinto se liga melhor, embora um branco com madeira e corpo também possa ser opção. Daqui para a frente, quando me referir ao bacalhau, estou a falar destes pratos e não das natinhas ou souflés.
6. Não gosto muito de vinho verde, embora beba de quando em vez.
7. O champanhe acompanha bem qualquer refeição, da entrada à sobremesa. Também já experimentei e gostei.
8. Não penso que o vinho tinto vá chocar com o sabor do bacalhau. Pelo contrário, se o vinho não tiver estrutura vai perder-se porque – sim, é verdade! – o bacalhau tem um sabor intenso. Mesmo se for tinto, mas desadequado.
9. Experimentem um Douro com uns 5 anitos a acompanhar uma posta de bacalhau com grão e depois venham falar comigo (logo após não, que o alho e a cebola são bastante activos no que toca ao hálito; deixem passar umas horas e lavem bem os dentes – depois disso já podem vir).
10. Em suma, e para fechar o círculo, não há dogma nenhum e, em última análise, se nos souber bem podemos beber o que quisermos. À vossa (levar o copo à boca e beber um bom trago, mas nada de alarvidades).
tuguinho, enófilo esforçado
P.S. – aqui que ninguém nos ouve, nem sou um grande apreciador de bacalhau… vou comendo…
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terça-feira, 27 de dezembro de 2005
Bacalhau: branco ou tinto? A polémica (1)
Uma conversa intrabloguista gerou uma discordância acerca do acompanhamento para o bacalhau. Isto porque o Tuguinho me surpreendeu ao revelar que bebeu vinho tinto pelo Natal a acompanhar bacalhau cozido com couve. Para além de eu não comer bacalhau com couve, achei estranho acompanhá-lo com tinto. Mal por mal, antes o branco.
Acontece que, na minha opinião, a questão do vinho tinto a acompanhar bacalhau, ao pretender contrariar o dogma de que tinto é para a carne e branco para o peixe, se tornou, ela própria, outro dogma, mas de sentido contrário. Para provar que nem sempre o tinto é para a carne e o branco para o peixe, convencionou-se que com bacalhau vai bem o tinto. Quanto a mim, mal.
Eu comi bacalhau com natas, e acompanhei com champanhe (sobre isso falarei proximamente). Se não o tivesse feito, o acompanhamento seria, seguramente, vinho branco ou verde. Isto porque quando comecei a beber vinho fui seguindo os conselhos que lia, e lá fui para o tinto com bacalhau. E posso afiançar-vos que nunca comi um prato de bacalhau com vinho tinto de que gostasse. Nem no bacalhau nem do vinho. Acho que se acaba por estragar as duas coisas. O bacalhau tem um sabor muito intenso e característico que choca com o vinho tinto, ao mesmo tempo que toda a gama de aromas e sabores deste tapa o sabor do bacalhau, enquanto que o branco, mais leve e suave, acaba por se misturar melhor com o sabor do prato. Para mim, em boa verdade, o ideal será, na maioria dos casos, um vinho verde. Já imaginaram bacalhau com natas, à Brás ou à Gomes de Sá com vinho tinto? Nem pensar!
Quando muito, admito que um bacalhau assado na brasa com batatas a murro possa ser acompanhado com vinho tinto, mas isso também é válido para um pargo assado no forno, um arroz de polvo ou umas lulas guisadas, mas nesses casos o branco também casa bem com o prato.
Por isso, quando vos disserem que bacalhau é com tinto, não sigam cegamente essa directiva, porque podem acabar por concluir, como eu, que está errada.
Kroniketas, enófilo esclarecido
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